terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Tontura



A terça feira amanheceu de forma revigorada, eu resolvi levantar cedo. Não que eu houvesse decidido que despertaria antes dos pratos trincarem na mesa e minha mãe exclamar que o almoço estava pronto. Eu não decido isso. É como se meu corpo se separasse de mim nessas horas, ele desperta quando sua recarga calórica está completa e as palpebras não pesam mais para abrir. Ou quando alguém o assusta. Por mais que nesse caso meu corpo seja superior a minha alma, outro corpo sempre seria superior a ele. O despertador não tocou oito horas como eu havia programado, e isso me deixou irritada. Eu acordei por invólucro do exterior, o telefone dela havia tocado e minha mãe remarcava o dentista daquele dia para a quarta. Meus olhos não abriram mas meu ouvido estava atento, meus sentidos também. Fiquei transtornada com o meu cansaço. Eu não havia feito nada no dia anterior, nada estressante para meus músculos, nada. Esse cansaço não era do meu corpo, era meu. Minha alma estava estressada com alguma coisa.

— Que horas são? — a voz ressoou.
Eu não esperava ficar ciente da resposta, a outra voz estava no objeto plástico sem fio recostado no ouvido dela. Estava me preparando pra jogar o braço ao lado, torcendo pra acertar o tato no meu celular traira pra descobrir o que eu não havia escutado.
— Oito e vinte? Ah... marca pras nove de amanhã então.

Parece que a necessidade de confirmação me salvou do esforço desnecessário. É engraçado, se minha alma se cansa meu corpo parece nem existir, fica pesado. E quando meu corpo se cansa minha alma reluta contra isso, mas ele continua pesado. A massa sempre ganha. Lembrei o que me afetava, eu estava apaixonada. E ao que minha memória refletia, não era correspondida. Então eu estava sem vontade de levantar, hum? Que se dane, vou levantar este peso morto da cama e vou colocar ele para trabalhar. A melhor forma de compensar o cansaço da alma, pra mim, sempre foi fatigar o corpo. Parece que um bom chá de adrenalina me coloca na linha com a realidade. Eu coloquei as mesmas músicas de sempre pra tocar, posicionei a bicicleta ergometrica em frente ao espelho e comecei a andar e a cantarolar pensando no quanto eu não podia pensar nele. Meu quarto está uma bagunça. Quando será que finalmente vão reformar esta droga? Esse não é meu quarto é o quarto da aurea negra e depressiva que me envolvia. Numa contradição meio estranha meu quarto era absolutamente colorido. E isso... ah... isso me estressava. Nada como entrar num local colorido que zombava de você com suas reluzencias quando tudo que você queria era dormir eternamente. Eu queria combiná-lo com minha nova aurea neo-clássica.

Depois de alguns exercicios no chão, eu me deitei nele, completamente. Fiquei observando o verniz desgastado do taco no chão. Depois as estrelas de plástico coladas no teto. Isso não tem absolutamente nada a ver comigo.

Quando levantei, creio que fui rápida demais. Me deu uma espécie de tontura, eu senti que se tentasse andar cambalearia de forma lenta e cairia no chão. Tudo começou a ficar branco, eu fechei os olhos e esperei a sensação de desmaio passar. Não desmaiei, que bom. Isso ocorre com frenquência, as vezes fico pensando se eu não tenho algum defeito cerebral e eu não sei. Talvez eu descubra isso daqui a alguns anos quando eu estiver entrando quase em coma e vá parar pela segunda vez num livro médico sobre doenças raras. Mas... Aquela sensação foi um pouco melhor que a adrenalina da agitação. Foi tipo o oposto. A mesma sensação de fatigação prazerosa, só que da alma, não do corpo. E aquilo foi maravilhoso. Meu corpo é agitado, então se manja na energia. E minha alma é tão calma, mas tão calma... que foi capaz de se deliciar com a sensação da agitação do corpo sumir. Depois de ler um pouco, aconteceu outra vez. Quando eu levantei a tontura veio, mas eu me deixei saborear. Me apoei na porta, fechei os olhos, vi tudo branco, meu corpo amoleceu. Maravilhoso.

É melhor do que ficar duas horas na cama acordada sem vontade de levantar. É melhor que chorar quando algo ruim acontece. É melhor que a sensação do fio dental rasgando a gengiva com força.
É sentir seu corpo e sua alma se dissiparem, ver o corpo morrer enquanto você está de pé. Os sentidos sumirem. Mas você sente que está lá no mesmo lugar. É como fechar os olhos numa praia, de madrugada, e só ouvir o que a natureza tenta lhe falar. A tontura dos meus dias é minha válvula de escape para as dores da realidade, é delicioso sair desse mundo sem mover musculo algum.

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